Queria outro nome para minha rua e que de
alguma forma ele resumisse tudo de lindo que se deve ter no endereço de morada.
Se ela fosse minha, eu mandaria ladrilhar
cores de sol por todo o caminho e todo mundo desfilaria distraidamente em
astros de todos os sistemas.
Crianças brincariam nos verdes e teriam
esconderijos em copas. Bancos de praça se espalhariam em frente às casas. À
leste uma vivenda protegida da chuva e aberta ao público com livros de todos os
tipos – ninguém e todo mundo iria organizá-los. À oeste outra com discos de
todas as épocas.
Na minha rua haveria amarelinha pintada no
chão, frutas nas árvores, azul no céu e calma nos olhares.
Os cachorros não latiriam amalucados, dariam
avisos simpáticos sobre a fidelidade. Passarinhos assobiariam para ouvidos de
Villa-Lobos e um ou outro bichano filhote apareceria para fazer companhia ao
menino que caiu da bicicleta.
Roupas esvoaçariam no varal como pendões e o
rio ali de trás teria água límpida e pedras brilhantes.
Ipês brancos em tempos de frio, flores nas
varandas, caixinhas de correio com nomes pintados, rostos sorridentes nas
soleiras, hortas nos quintais e um cheirinho de bolo de fubá sem remetente
conhecido.
A minha rua perfeita teria alguns buracos, mas só para formar poça e animar a brincadeira na chuva que cairia depois de um dia de muito calor.
A minha rua perfeita teria alguns buracos, mas só para formar poça e animar a brincadeira na chuva que cairia depois de um dia de muito calor.
E lá não morariam vizinhos, todos
conjugaríamos a política da boa amizade, a conversar, respeitar espaços e guardar
os silêncios necessários.
Mas a rua que eu queria mesmo ter imaginado,
é a Rua de Rimas de Guilherme de Almeida, que narro desde menina, a me encantar com ritmo e imagens:
A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino
é uma rua de poeta, reta, quieta, discreta,
direita, estreita, bem feita, perfeita,
com pregões matinais de jornais, aventais nos portais, animais e
varais nos quintais;
e acácias paralelas, todas elas belas, singelas, amarelas,
douradas, descabeladas, debruçadas como namoradas para as calçadas;
e um passo, de espaço a espaço, no mormaço de aço baço e lasso;
e algum piano provinciano, quotidiano, desumano,
mas brando e brando, soltando, de vez em quando,
na luz rara de opala de uma sala uma escala clara que embala;
e, no ar de uma tarde que arde, o alarde das crianças do
arrabalde;
e de noite, no ócio capadócio,
junto aos lampiões espiões, os bordões dos violões;
e a serenata ao luar de prata (Mulata ingrata que mata…);
e depois o silêncio, o denso, o intenso, o imenso silêncio…
A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino
é uma rua qualquer onde desfolha um malmequer uma mulher que bem
me quer
é uma rua, como todas as ruas, com suas duas calças nuas,
correndo paralelamente, como a sorte diferente de toda gente, para
a frente,
para o infinito; mas uma rua que tem escrito um nome bonito,
bendito, que sempre repito
e que rima com mocidade, liberdade, tranqüilidade:
RUA DA FELICIDADE…
Nenhum comentário:
Postar um comentário