segunda-feira, 4 de agosto de 2014

inimigos


A vontade de retroceder três quilos na balança me colocou a fazer regime. A necessidade de endurecer um pouco a musculatura me levou à academia.

O regime parece um primo chato; todo certinho, orgulho da família, notas boas, educação primorosa, um tanto sádico e dedo duro. Tem prazer em ficar testando a minha força de vontade, quer, de toda forma, me provar fraca, pouco confiável, incapaz.
Não sei da onde ele adquiriu poderes supremos, entra na minha cabeça e me provoca. Pego uma maçã e estou prestes a rasgar-lhe a carne, ele me sopra com voz de diabinho, tem chocolate no armário. Abro a geladeira e enquanto deslizo até a gavetinha da alface e seus amigos, ele joga bem na minha cara o pudim brilhante e dourado. E se digo não à suculenta macarronada do restaurante, quer me convencer de que só hoje não faz mal.

A academia é tia chata, barulhenta e sem graça. Verruga no nariz, bruxa má. Tem o canto da sereia ao contrário, com música repugnante e amizades pouco convidativas.
Haviam me avisado, não olhe diretamente nos olhos dela. Ingênua, encarei. Toda a sua anti-sedução tomou conta de mim e ela rogou praga pior que de madrinha: não durmo bem nas noites de domingos, terças e quintas, porque ela me espera segundas, quartas e sextas. Amanheço exausta, sem poder trocar a cama pela dita. Depois, ela sapateia, gargalha seus poderes de feiticeira e me joga o boleto bancário para que eu veja mensalidade que paguei sem gastar.
Dia desses resolvi enganá-la. Me achando espertinha levei de presente um pacotinho com músicas. Todas vibrantes, interessantes, fina-flor para os esqueletos dançantes. Riu-se, se fechou para o novo e me humilhou, isso não serve.  

Caí, bati três vezes na lona, pedi pizza e cantarolei com Cole Porter. Achei que o assunto estava encerrado, havia assumido minha fraqueza. Foi aí que a dupla regime-academia chamou reforços para tripudiar: saio do banho e o espelho se mete na minha frente. 


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