Estou na companhia da saudade. Ela é visitante
sem jeito, não sabe das boas maneiras, não se comporta na casa alheia. É
espaçosa, barulhenta, imensa para os meus cômodos.
Horas atrás eu reclamei que fosse embora,
mostrei-lhe o caminho do mundo e pedi que seguisse. Nada. A saudade é teimosa.
Inconveniente, faz livre escolha de quando
entra em minha casa. Também determina conteúdo das suas malas.
Inventa histórias, nubla o passado, desdiz o
futuro, fala mil bobagens, tem o canto hipnótico das sereias – ela é
trapaceira!
A saudade gosta do vento que sopra do sul, se
embala com ele e deixa que seu corpãozão seja empurrado até se alojar no
coração dos fracos, eu.
E uma vez instalada, ela vira uma praguinha,
pequenininha, mesquinha, cupim em madeira, e vai, em gerúndio, roendo todo o
agora. Nem dá pra saber direito o que está indo embora e o que está criando
raízes.
Os insultos da saudade percorrem o corpo:
coçam a pele, escorrem pelos olhos, desabam nos frios do estômago, doem na
cabeça.
Não há jeito do bom combate, de justiça de
armas: pra cada foto rasgada, ela inventa dezessete imagens; em cada música de
distração, ela compõe sentidos diferentes; quando queimo uma carta, ela acende
a luz da cabeceira. Até um fio de cabelo no chão conta uma história imensa.
A saudade é o veneno da alma, é ela quem nos
rouba os melhores dias e as medidas dos quadris: me afundo em pote de
brigadeiro!
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