quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

haverá paradeiro para o nosso desejo?

Eu fiz um plano para minha vida. Há anos o acaricio. Minhas melhores músicas são para niná-lo. Meus versos definitivos, para saudá-lo. 

No meu primeiro dia de lucidez, revirei os olhos, pintei tela e resolvi sonhar. Sonhei um sonho só. Não conheço outro. 

Nesse caso nunca tive pés fincados. Deixei o vento soprar, fechei os olhos e vi o melhor cenário, aquele, de fadas. E flutuei tanto que muitas vezes quando acordei, surto de realidade, percebi que nunca terei recursos suficientes para misturar o que é do ar com o que é da terra. Frustração. 

Talvez, além de dinheiro, me falte disposição e disciplina. Bom seria se o sonho se realizasse por ele mesmo, por sua beleza e por minha vontade. 

Eu sei quanto custa sonhar. Mas sei como sai caro viver acordada. 


Um dia desses vi um lugar e pensei que lá o meu sonho poderia se instalar e virar  matéria. Sem grana, nem quis saber valores. Saber isso poderia matar o meu sonho. E eu não quero que ele morra. 

Ainda que a consciência me persiga a me chacoalhar a cada instante, eu acho bom ter um sonho. 
Meu plano de vida se transformou em linha do horizonte. Ando, ando, ando e estou sempre longe. Mas ando.  E no caminho descubro coisas, conheço pessoas, amanso o coração. No trajeto reafirmo vontade, coloco a cabeça para funcionar, coleciono possibilidades. 
Talvez seja o percurso coisa mais interessante que a chegada. Mais que isso, talvez minha vida seja o percurso, a tentativa, a vontade e nunca a chegada...


Ironicamente, esse movimento todo é para alimentar um sonho chamado Pousada.


terça-feira, 3 de dezembro de 2013

vim parando por aí...


Colecionei bobagens em baús e abri gavetas mofadas para que fantasmas pulassem. Ataquei-os.

Descobri mistérios, desvendei segredos, criei enigmas. Andei, pé ante pé, ao ladinho de precipícios, joguei fora a sombrinha, escorreguei.

Caí, levantei, repeti.

Construí realidade paralela. Comprei passagens. Descobri outro mundo. Ganhei presentes.

Aprendi lições, ensinei outras, tornei a aprender o que ensinei e esqueci o que aprendi.

Voei perto de estrelas. Rastejei em terra seca. Cavei buraco. Afundei no poço.

Tomei impulso. Desci ladeira. Saltei tobogã. Pedalei milhas.

Cansei, descansei, repeti.

Não sei mais de onde vim, nasci, cresci. Esqueci tudo que fiz.

Não tenho planos, desenganos ou esperanças. Sou só. Só sou.

Estou aqui, geografia alterada, caminho trancado, grades no coração. Provoco novos amores, deixo cair vidros que se espatifam no chão.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

do amor que não se repete - e se repete sempre.


Eu tive muitas mães na minha infância. Uma rua inteirinha de mães que me chamavam pelo nome, pelo apelido, pelo sobrenome, pelo nome dos meus irmãos, dos meus colegas, me chamavam por a filha da Reny, a filha do Paulo.

As mães da minha infância eram minhas e de toda a rua. Brincávamos livres: bola, bicicleta, rolimã, bets, conversinhas, esconde-esconde. E todos obedecíamos em uníssono ao toque de recolher da primeira que chegava à janela e anunciava o relógio, o fim da zoeira. Desmontávamos cenários, carregávamos objetos e seguíamos... cada um para a própria casa, a obedecer a própria mãe que tinha ordem igual a qualquer outra: banho, jantar, dentes e cama.  

O nosso respeito era igualzinho para todas. Cada uma tinha total autoridade sobre nós. As ordens pareciam vassouras gigantes que empurravam toda gurizada de um único jeito. Fomos, na rua da minha infância, todos criados iguais. E quando um assunto grave era denunciado, uma perna quebrada no futebol, um bêbado rondando a rua, um vidro estilhaçado por bola, as mães logo se reuniam para discutir providências e anunciar nosso novo modus operandi.

Cresci. Crescemos. Cada um buscou a própria vida.

Hoje sou mãe de um casal. E tenho muitos outros filhos e filhas. Não há mais brincadeira na rua, mas nas primeiras horas do meu mais velho, eu e todas as mães organizávamos a bagunça no condomínio e cabia a cada uma de nós, e a todas, zelar pelo bem estar da turminha. As preocupações maternas se estendiam por todos aqueles que tinham altura parecida com a do Dé. Quanta preocupação com todos eles...
As amigas da Lívia viraram minhas filhas e sempre estou a pensar nelas também, no presente, no futuro, a desejar que a vida lhes seja boa e a tratar de conselhos e falas quando necessário.

Melhor é saber que os meus filhos também tiveram e têm muitas mães. O Dé já tem idade suficiente para não precisar dessas batutas, mas a Lívia ainda dança conforme nossa música. E hoje, quando preciso de cuidado especial, fora do meu controle, passo a mão no telefone e converso com a mãe substituta a entregar a cria com a certeza dos mesmos cuidados.

Mãe só tem uma e todas são iguais e são mães de todos...