domingo, 31 de março de 2013

feliz

quando era criança, minha mãe sempre organizou imensas festas de aniversário. ano após ano, a casa cheia, a vida em festa. gostava. não podia escolher meus convidados, não podia palpitar na comida, não podia me vestir do jeito que queria... mas gostava. sempre entendi aquela movimentação toda da minha mãe, como uma atenção especial, coisa exclusiva, um dia meu em que minha mãe fazia coisas pra mim. exclusividade - gosto muito!
cresci um pouco e comecei a sacar que se não podia palpitar em nada, era porque a festa não era minha e nem pra mim.
passei a detestar meu aniversário.

pulei para um tempo em que eu nao gostava de comemorar aniversário, me escondia das pessoas, procurava ficar quieta, sozinha.

percebi que os meus se chateavam em não poder festejar o meu dia. e abri concessões. pequenos encontros, reuniões particulares, almoços para poucos.

o tempo passou e comecei a sentir falta de algumas pessoas em minhas comemorações. e estendi convites, ofereci casa, fiz bolos, salgadinhos, bebidas.

hoje, amo receber as mensagens de longe e de perto. de gente que conheço bem, outros só de vista... estou num tempo que se houvesse condiçõe$ faria grandes festas, para encontrar cada um daqueles que fazem parte da minha caminhada... 

recebi mais de 300 felicitações: por email, pelo FB, por mensagem, por telefone, pela memória e até pessoalmente. 
a permissão para que o amor circule, para ser abraçada, beijada, querida é uma maravilha, inunda a alma!

quem sabe, ano que vem consigo reunir em espaço físico grandes pessoas, que admiro e quero perto, bem perto!
tim-tim! 




terça-feira, 26 de março de 2013

sal


Eu nunca me cansei do mar. O eterno avanço e recuo me levam e me trazem com a fome de pensar e repensar, de partir e voltar, de ter e soltar.

Nas minhas horas malsãs é com o sal que me curo. Na comemoração de grandes alegrias brindo com espuma.

No ritmo das ondas, no batuque do mar eu sinto meu corpo, o pulsar da vida, a coragem de desbravador, a calma de pescador e a solidão de marinheiro. No indo e vindo infinito é que reconheço meus ciclos.

Gosto das coisas do mar: ventos, sabores, saberes, mistérios, viagens – partidas e chegadas. 

Nunca pensei em me lançar em grande navio, nem em canoa furada. Nunca me senti capaz de abandono do cais, mas sou experiente em longas despedidas. 

Nem tudo que o mar me traz, eu devolvo. Nem sempre lhe encaminho oferendas. Todas as garrafas já foram lançadas, mas continuo a renovar esse compromisso e faço votos de novas ondas. 

Espelho do céu, dono de mistérios, depósito de esperanças. Como bem disse o grande Mia Couto, quem nunca viu o mar, não sabe o que é chorar! 


sábado, 23 de março de 2013

quimeras mil


Tempo atrás o diabo me visitou. Sedutor, tratou de fazer graça, jogar charme, preparar terreno. Trouxe flores, cantou a mais bonita das músicas, me tirou pra dançar. Preparou drinks, fez comidinhas e me desafiou para misterioso jogo.


O fascínio desta visita é o perigo, o risco, a corda bamba. O diabo não gosta de certezas, não inspira confiança, emite prazo de validade para as situações, mas não o revela. E quem abre a porta e permite sua entrada, vive com a guilhotina a apontar, sedenta, para o pescocinho.

Eu nem quis deixá-lo entrar. Também não tratei de evitá-lo. Fui observando-o, adivinhando-o, assistindo-o. Mas ele conhece as receitas de sereia, sabe muito sobre  fascínio. O jogo se estabelece rápido, ágil, agressivamente agradável. Explode em prazeres e se tranca na alma.

No dia em que o diabo me soube sorridente, me olhou nos olhos, fundo nos olhos, e eu entendi que estava perdida. Silêncio.

Com chicote no olhar, nenhum perdão e garras afiadas, o diabo espera a hora precisa e conta a que veio: esmigalha rosas, pisa em sonhos, lança flecha envenenada, apaga luzes. Ri satisfeito e vai embora.

Mas o pior, o pior de tudo, é que ele muda de nome, de figura, de papel. Te procura distraída em situações diferentes, dá um tempo e quando você está se colocando de pé, ele bate à porta, sorridente e sedutor, não pede licença e se instala para te puxar pela mão e te convidar a nova viagem.

Quem resiste? 





sexta-feira, 15 de março de 2013

o bom da vida vai prosseguir


A primeira notícia que vi no jornal hoje cedinho dava conta do coma irreversível de Dominguinhos. 

Eu tive a sorte, a grande sorte, de conhecê-lo e de me tornar sua amiga e, mais que isso, de tê-lo como amigo. Muitas vezes o recebi em minha casa; tive a honra de dividir café da manhã, almoço e jantar; pude partilhá-lo com minha família; ouvi seus conselhos, sábios conselhos; palpitei em sua vida...


com minha mãe, em almoço surpresa para ele e para ela.

Domingos é uma pessoa muito importante pra mim! Desde a primeira hora de convívio sempre me acompanhou a sensação de que nunca mais ficaria sozinha em algum tropeço...  Ele já me tirou de frias, encrencas, dificuldades algumas vezes. 
De um jeito manso, doce e absolutamente surpreendente ele me ligava e com a voz sertaneja disparava:
- Adriana! O que está acontecendo? Me conte que dou jeito. 
Eu, do outro da linha, sempre fiquei chocada com essa capacidade. Nos meus desertos, ele me adivinhou muitas vezes e, boa parte delas, me ajudou só com a força de sua palavra, a coragem de pensamentos diferentes de uma cabeça livre e pronta pra tudo. Em outras, tratou de maneira prática minhas pendengas financeiras, minhas dificuldades cotidianas. 

É uma sorte muito grande ter alguém assim na vida! E o meu sentimento de amor e de gratidão por ele é uma das coisas mais bonitas e puras que mora dentro de mim. (Também é uma sorte muito grande poder sentir isso.) 


no tempo em que eu ainda tinha covinha...
Mesmo correndo o risco do post ficar imenso, quero muito contar uma história. 

Em 2011, o João Egashira me procurou com a ideia de que sua Orquestra à Base de Cordas e as rádios fizessem homenagem ao Domingos, que a TV gravasse DVD e que chamássemos algumas pessoas para assistir isso tudo. Pois bem, assim foi. 

A combinação dos músicos da Orquestra, mais as músicas de Domingos, mais seus músicos e mais o próprio empunhando a sanfona a cantar e tratar das belezas da alma, foi incrivelmente emocionante e comovente. 
Lá pelas tantas, depois de “De Volta pro Aconchego” eu tinha que entrar no palco, com flores, placa e discurso para surpreendê-lo. Mas eu estava tão emocionada com tudo que já tinha rolado até ali (outra hora eu conto), que já subi no palco muito emocionada e o que era pra ser uma homenagem da instituição, virou um testemunho pessoal sobre tudo que penso dele. Falei de tudo: amor, gratidão, respeito, bondade, generosidade, cuidado e até de sua música... Chorei. Ele chorou. Sabíamos bem. Quando voltei pro meu lugarzinho, ele começou a tocar uma música linda. Não uma que mostrava sua habilidade de sanfoneiro com dedos espertos e velozes, mas uma que revelava sua grande arte de melodista, de entendedor da alma. Uma valsa tão cheia de beleza, que eu e João ficamos quietos, ouvindo, chorando. Nenhum de nós conhecia, mas tinha uma coisa tão grande na música que dava vontade de ficar o resto da vida ouvindo-a. Quando acabou, ele revelou: “O nome dessa música é Adriana, eu acabei de fazer!”.

Hoje, o que sei, é que quero muito vê-lo, reencontrá-lo. Não acredito que o jornal esteja certo, que os médicos estejam certos... Eu acho que ele vai mesmo tratar de colocar em prática aquela coragem nordestina, aquela sobrevivência sertaneja, aquela teimosia de sanfoneiro e daqui a pouco pinta por aqui, com sorriso sincero, com abraço, proteção e tudo, tudo, tudo que compõe uma das maiores existências que conheço. 





sexta-feira, 8 de março de 2013

você tem medo de quê?

Eu tenho muitos medos!
Medo de aranha, do escuro e da falta de grana
Medo de assalto, de tristeza sem fim e de lugares pequenos
Tenho medo de ficar doente, de magoar pessoas, de engasgar
Medo que me machuquem, de escorregar, de cortar o cabelo
Tenho medo de multidões, de água gelada, de andar descalça...

Tenho um milhão de medos, mas me acompanha, desde as primeiras horas, coragem para enfrentar todos! 
E o melhor: sorrindo! Que assim me conserve...

domingo, 3 de março de 2013

a arte da reversão


Aos quatro anos aprendi a amarrar meus cadarços.

Minha vida mudou!

Variações da mesma habilidade me servem até hoje para prender laço no cabelo, fechar cintura da saia, segurar biquíni, guardar o carregador do telefone, iniciar costura, fabricar penduricalhos, moldar fitas, ajeitar gravata, fabricar buquês, fingir de marinheiro, emendar corda bamba, dar nó em pingo d’água...

O que eu ainda não sei é afrouxar o que não precisa de tanta força.